AS TRÊS SEMENTINHAS
E conheça, enfim, o que
em si é belo.
(Platão, O Banquete)
ERAM três sementinhas plantadas debaixo da terra.
Estavam ali por acaso -
pensavam. Não sabiam como ou por que foram lançadas a um lugar tão escuro.
Desconheciam o sol, o dia, o brilho das estrelas e a claridade do luar. Ouviam,
às vezes, o cantar de um pássaro. Não compreendiam. Pensavam que era a terra
quem cantava. Não imaginavam que havia uma infinidade de coisas acima daquele
manto de terra, que pra elas era tudo.
Conheciam o mundo
inteiro naquele pequeno pedaço de chão. (Para elas, o mundo era apenas o que se
podia ver ou tocar).
Assim passavam os
dias...
Certa vez, uma gotinha
d’água conseguiu escorregar bem devagarzinho pelas frestas do solo e bateu de
cheio nas sementinhas. Foi um dia de luta. Elas passaram muito frio e quase
adoeceram após tamanha enxurrada.
O tempo passou. A terra
ficou novamente aquecida - presente do semeador para a semeadura. E uma das
três sementinhas ficou tão agitada que escolheu, apesar das incertezas,
descobrir de onde havia vindo aquela gota d’água que as encharcou.
- Vamos! Deve haver
alguma coisa diferente lá em cima - dizia, apontando para o alto.
- Tolice, não existe
nada lá, além de terra e mais terra, que já conhecemos! - respondiam as outras.
- Mas vocês não têm
curiosidade em conhecer algo novo? - insistia a primeira sementinha.
E as outras falavam:
- O mundo é apenas isto
que vemos, o que os nossos sentidos alcançam. Esta é a nossa natureza, e não
podemos fugir a ela. Devemos aceitá-la como a única verdade lógica existente.
Mas a sementinha,
curiosa, que não se conformava mais com uma ideia tão limitada de mundo, quis
se aventurar. Com toda coragem, começou a subir... subir... subir... até que,
encontrando o limite entre a terra e o ar, sentiu o calor do sol batendo em seu
rosto e viu os raios luminosos do dia pela primeira vez.
Ficou ao mesmo tempo
assustada e embevecida. Não imaginava que pudesse existir algo assim tão belo.
Começou a conhecer o
mundo, as coisas, as cores, as folhas, as flores, os rios, as árvores e o sopro
do vento.
Em tanto encanto olhou
para si mesma... E percebeu que também havia mudado. Já não era mais uma
semente, era um broto, uma folhinha verde crescendo... E viu que tudo isso era
bom, que o amor é uma melodia silenciosa que toca mais fundo na alma...
Como contar às outras o
que descobriu? Não poderia mais voltar. Mesmo se voltasse elas não
acreditariam.
Era grandioso demais
tudo o que havia encontrado. Tão diferente daquela covinha escura debaixo da
terra. Contudo, era ainda lá que mantinha suas raízes, que lhe davam forças
para ficar de pé e energia para viver. E
isso também era bom.
Quando chegou a noite,
a lua clareou o céu e as estrelas brilharam intensamente. A “sementinha em
folha” viu que ainda havia muita coisa para conhecer e amar. E, mesmo que
viesse a sofrer por isso muitas vezes, valeria à pena.
Sim, valeria à pena
doar todo o seu perfume e toda a sua essência aos braços do infinito céu azul,
cheio de mistérios e estrelas cintilantes.
Floresta de Poesia, páginas 23 a 27, de Wagner Fernandes Fonseca.
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